Brasil

Médica no DF identifica pacientes de Covid descrevendo suas 'paixões'

Isadora Jochims, reumatologista no Hospital Universitário de Brasília (HUB), conta que iniciativa pretende humanizar atendimentos

Por G1 DF 01/04/2021 09h09 - Atualizado em 01/04/2021 09h09
Médica no DF identifica pacientes de Covid descrevendo suas 'paixões'
Bilhete identifica paciente com suas paixões no Hospital Universitário de Brasília (HUB) - Foto: Arquivo pessoal

Em uma ala isolada para casos da Covid-19, no Hospital Universitário de Brasília (HUB), pacientes são identificados com informações que vão além do nome completo, idade e número do leito. Uma iniciativa idealizada pela reumatologista Isadora Jochims mostra um pouco sobre quem, de fato, está naquele leito específico. É o que ela chama de "prontuário afetivo".

"Gosta de: barulho de água e passarinho; Raul Seixas; música sertaneja raiz", aparece escrito em um dos bilhetes.

Segundo Isadora, de 35 anos, a iniciativa faz parte de ações para "humanizar o atendimento", em meio ao cenário de pandemia.

"Estou cansada de ouvir que estamos em uma guerra. Não estamos em uma guerra, estamos em uma pandemia, cuidando de vidas", diz a médica.


Bilhete identifica paciente com suas paixões no Hospital Universitário de Brasília (HUB) — Foto: Arquivo pessoal



A arte de salvar vidas

Ainda antes de se formar, Isadora já se interessava por intervenções artísticas. Hoje, ela atua na Comissão de Humanização do HUB, e conta que o prontuário afetivo é uma das muitas expressões de arte possíveis.

"Essa ideia de intervenções artísticas no ambiente de saúde foi uma questão de sobrevivência. De tornar o ambiente mais leve, provocando os profissionais que estão ali, atuando", conta.

Uma das atividades diárias da reumatologista é ligar para os familiares dos pacientes para informar sobre o estado de saúde, já que os infectados pelo novo coronavírus não recebem visitas. Foi durante as chamadas que a médica descobriu as paixões dos doentes.

"Eu passava todas as informações médicas, aí perguntei: 'Olha, se por acaso ele acordar de uma sedação, o que ele gostaria de ouvir? Do que ele gosta?", lembra.

"Do outro lado da linha, ouvi um sorriso, uma risada. E as pessoas diziam: 'Ele é torcedor do Palmeiras', 'gosta de Raul Seixas ', e fomos anotando", diz Isadora.

No leito de um palmeirense intubado, e em coma induzido, tem o aviso: "O Palmeiras ganhou". O recado, é para que o paciente tenha uma boa notícia boa quando acordar.

Tocar os sentimentos dos pacientes, da família e dos profissionais, segundo a médica, é essencial. "A gente chama de arte relacional", explica ela.

Intervenção artística no Hospital Universitário de Brasília (HUB) faz parte de projeto para humanizar atendimento — Foto: Arquivo pessoal

"A arte não existe se não tiver o outro. Pra ela acontecer, eu preciso da resposta do familiar, dos profissionais que estão ali e provocar as mudanças na relação", diz.

A iniciativa começou no domingo no final de março, mês em que o Distrito Federal registrou o maior número de hospitalizados e de mortes por Covid-19. O prontuário efetivo está sendo colocado em prática na enfermaria.

"Os médicos acharam engraçado. Perguntavam: 'Ei, quem colocou isso aqui?', conta a médica Isadora Jochims.

"Depois, muitos começaram a cantar algumas músicas que os pacientes gostavam", diz ela

Uma das enfermeiras que trabalha na equipe, Dayani Adami, também colabora com os prontuários e defende esse tipo de contato com o paciente. Dayani diz que os pacientes, mesmo sedados, podem reagir a algumas canções.

"Esse daqui não é só o paciente do leito 1. Esse daqui é o paciente que gosta da música tal, que gosta de comer tal coisa, que tem filhos. Quando a gente sabe que o paciente é o amor de alguém, a gente tem que cuidar dele como se fosse alguém da nossa família", resume Dayani.