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Gari alagoano realiza sonho e participa da corrida de São Silvestre

Rede de solidariedade levou Zé Carlos à competição internacional

Por Fernando Vinícius/7 Segundos 01/01/2018 13h01
Gari alagoano realiza sonho e participa da corrida de São Silvestre
Zé Carlos, o gari atleta alagoano, antes de participar da São Silvestre - Foto: Cortesia

José Carlos Soares nunca teve orientação profissional para praticar o esporte que ama. Nem tão pouco tem condições financeiras para seguir uma dieta adequada e muito menos comprar um par de tênis adequado para correr.

Apesar desses obstáculos na vida do gari alagoano, Zé Carlos realizou o sonho de muitos praticantes de corridas de longa distância: ele participou da São Silvestre.

Aos 37 anos, o atleta amador que ganha a vida recolhendo lixo doméstico nas casas de Penedo foi para São Paulo e ficou apenas a 7 minutos do tempo do melhor brasileiro na edição 2017 da competição.

Um dos responsáveis pela ida do gari para a corrida internacional é o economista Eronildes Tavares Júnior. Funcionário público federal e também praticante de corridas de longa distância, ele ficou impressionado com a performance de Zé Carlos numa corrida de 19 km realizada em Penedo em 7 de setembro de 2017.

“Eu o vi correndo e percebi o quanto ele é diferenciado, tanto que chegou em primeiro com dez minutos de diferença para o segundo. Um amigo que acompanhava ele de moto me disse que a média do Zé Carlos é de 19,20 km/h. Os quenianos fazem 20, 21 km/hora”, comparou Eron, como é conhecido

Representantes da Carcará, equipe que reúne praticantes de corridas em Arapiraca, também observaram o desempenho de atleta amador na corrida que desencadeou uma rede de solidariedade, corrente do bem que levou o gari até a São Silvestre.

Com apoio da Carcará e do servidor federal, Zé Carlos foi inscrito em corrida de 5 km em Maceió. Com tênis furado e rasgado, ele venceu, superando inclusive corredor profissional patrocinado pelo Cruzeiro, conhecido clube mineiro que investe em vários esportes, além do futebol.

Com ajuda do dono da Victor Center, situada em Penedo, Zé Carlos ganhou calçados adequados e partiu para tentar chegar na São Silvestre. A proposta ganhou que espaço na mídia local e estadual foi seguida de vitórias em competições realizadas em Arapiraca, Salvador, Aracaju e São José da Tapera-AL.

“A meta era tentar alcançar o índice para colocar ele no pelotão de elite da São Silvestre, 10 quilômetros em até 31 minutos, percurso que ele faz em 32”, informa Eron Tavares ao 7Segundos.

 Mesmo sem o índice, Zé Carlos foi inscrito na prova pelo dono da Academia Saúde & Vida, que funciona em Penedo, mais um elo na rede de solidariedade que o levou para São Paulo.

O projeto de colocar o ‘gari atleta’ alagoano ao lado dos melhores do mundo ganhou fôlego com a liberação de uma bolsa-atleta pela prefeitura de Penedo no valor de R$ 1.400,00. Zé Carlos trabalha na coleta do lixo doméstico na Cidade Histórica e ganha por produtividade, na condição de Micro Empreendedor Individual (MEI), forma adotada pelo governo penedense para pagar trabalhadores de alguns setores que não são efetivos.

O desempenho do ‘gari atleta’ chegou ao conhecimento de um empresário paulistano, dono de uma rede de óticas que também pratica corridas, cidadão que o acolheu em São Paulo, pagou hospedagem do Zé Carlos em hotel próximo da Avenida Paulista, mostrou o percurso da São Silvestres e o levou ao Parque do Ibirapuera, onde Zé Carlos posou ao lado de atletas, entre eles o queniano Edwin Rotich, terceiro lugar na prova.

A posição de Zé Carlos na linha de chegada ainda é desconhecida. A organização da prova divulgará o resultado dos demais atletas somente a partir do dia 03 de janeiro, mas isso pouco importa. Além de driblar quatro pelotões de corredores – ele iria sair no último – e conseguir ficar no terceiro, o ‘gari atleta’ chegou a apenas 7 minutos do brasileiro melhor colocado, Ederson Vilela, o 11º a cruzar a linha de chegada.

Para quem chegou duas horas antes do início da corrida – tempo que precisou para passar despercebido pela fiscalização da prova e se aproximar o máximo que conseguiu dos atletas de ponta -, sem poder fazer aquecimento adequado (não há espaço para fazer alongamentos) e carregando todo esse histórico de vida, Zé Carlos tem mais uma vitória em sua galeria de conquistas.